Você sabe o que significa o termo "coisas vagas"? Sabe que existe um procedimento específico na legislação brasileira sobre isso? Não? Fique agora então com um paper de minha autoria, em parceria com a Dr. Iorrane Mathias, sobre o assunto.
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COISAS VAGAS: COMENTÁRIOS AO ART. 746 DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL BRASILEIRO
Coisas Vagas: comments to art. 746 from new Brazilian Code of Civil Procedure
Gabriel Lemos Rocha[1]
Iorrane Mathias da Silva[2]
RESUMO
O novo Código de Processo Civil brasileiro em seu art. 746 traz um simples procedimento destinado à tutela das chamadas “Coisas Vagas”. Este não é um procedimento novo, pois já existia no Código de Processo Civil anterior, porém, o novo código trouxe algumas importantes alterações.
Palavras-chave: Procedimentos Especiais; Coisas Vagas; Novo Código de Processo Civil; CPC/15; Mudanças.
ABSTRACT
The new Brazilian Civil Procedure Code in its art. 746 provides a simple procedure for the tutelage of so-called "Coisas Vagas". This is not a new procedure, it already existed in the previous Code of Civil Procedure, however, the new code has brought some important changes.
Keywords: Special Procedures; Jobs things; New Civil Procedure Code; CPC / 15; Changes.
SUMÁRIO
Introdução; 1- Definição; 2- Pré-processo; 3- Procedimento; 4- Recompensa; 5- Código Penal; 6- Comparação entre o CPC/73 e o CPC/15; 7- Conclusão; Referências Bibliográficas.
INTRODUÇÃO
O Novo Código de Processo Civil prevê em seu artigo 746 um simples procedimento especial de jurisdição voluntária para a tutela das denominadas “Coisas Vagas”, isto é, coisas alheias encontradas. Ressalta-se que este não é um procedimento novo, pois já existia procedimento similar no Código de Processo Civil de 1973 (art. 1.170 e subsequentes), mas trouxe algumas alterações, de modo a simplificar o procedimento, reduzindo de sete artigos (como era no CPC/73) para apenas um artigo (CPC/15).
Destaca-se que este procedimento, embora simples e previsto em apenas um artigo, é importante, uma vez se relaciona com os artigos 1.233/1.237 do código civil, que tratam da descoberta de coisa alheia perdida, sendo a regulamentação processual da matéria tratada nesses dispositivos.
1- DEFINIÇÃO
Coisa vaga é a coisa alheia que foi perdida (não abandonada) pelo dono legítimo ou possuidor e descoberta por outrem. Nas palavras de Rios Gonçalves “Coisa vaga é a alheia que foi perdida pelo legítimo dono ou possuidor. Não se confunde com a abandonada, que não tem dono, e que passa a pertencer a quem encontrá-la e dela se apropriar.”[3]
2- PRÉ-PROCESSO
Conforme destaca José Miguel Garcia Medina (p. 653) “O art. 746 do CPC/2015 dispõe sobre o procedimento destinado a viabilizar o cumprimento do dever de restituição da coisa alheia encontrada, a que se referem os arts. 1.233 ss. do CC/2002”.[4]
O art. 1233 do Código Civil dispõe que quem achar coisa alheia perdida, deve restituí-la ao dono. O parágrafo único deste artigo, por sua vez, determina que caso o descobridor não conheça o legítimo dono da coisa encontrada, fará por encontra-lo e, caso não encontre, deverá entregar a coisa achada à autoridade competente.
Da leitura do art. 746 do CPC/15, extrai-se que a coisa achada pode ser entregue tanto para autoridade policial, quanto para o juízo competente. Se o juízo competente receber a coisa do descobridor, aplicará o caput do artigo 746 do CPC/15. Se a autoridade policial receber do descobridor, remeterá a coisa, em seguida, para o juízo competente (art. 746, §1º do CPC/15).
Conforme lembra Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero “Aquele que se omite na entrega à autoridade competente da coisa achada, pode incorrer no tipo do art. 169, parágrafo único, II, CP – apropriação de coisa achada”.[5]
3- PROCEDIMENTO
Recebendo a coisa o juiz mandará lavrar o respectivo auto, do qual constará a descrição do bem e as declarações do descobridor (Art. 746, caput do CPC/15).
Depositada a coisa, o juiz mandará publicar edital na rede mundial de computadores, no sítio do Tribunal a que estiver vinculado e na plataforma de editais do Conselho Nacional de Justiça ou, não havendo sítio, no órgão oficial e na imprensa da comarca, para que o dono ou o legítimo possuidor da coisa a reclame (art. 746, § 2º do CPC/2015).
Em se tratando de coisa de pequeno valor e não sendo possível a publicação no sítio do Tribunal o edital será afixado no átrio do edifício do fórum (art. 746, §2º, CPC/2015).
O proprietário ou legítimo possuidor da coisa terá 60 (sessenta) dias para reclamar a coisa, a partir da divulgação da notícia da descoberta. Se decorrido o prazo e o proprietário não se manifestar, será esta leiloada por iniciativa particular ou em hasta pública (art. 879 e seguintes do CPC/2015), a critério do juízo, e, deduzidas as despesas, mais a recompensa do descobridor, pertencerá o remanescente ao Município do lugar em que se deparou o objeto perdido (art. 1.237, caput, CC/2002).
Segundo Daniel Mitidiero, Luiz Guilherme Marinoni e Sergio Cruz Arenhart o mesmo se aplica aos objetos achados no Distrito Federal e nos territórios federais, quando a coisa pertencerá à União.[6]
Caso o proprietário decida por abandonar a coisa, poderá o descobridor requerer que lhe seja adjudicada. O mesmo se o ente público resolver abandoná-la em favor do descobridor, na hipótese de ser de diminuto valor (art. 1.237, §único, CC/2002).
4- RECOMPENSA
De acordo com o código civil, aquele que restituir a coisa achada, terá direito a uma recompensa não inferior a cinco por cento do seu valor, bem como à indenização pelas despesas que houver feito com a conservação e transporte da coisa, se o dono não preferir abandoná-la. (art. 1.234, caput, CC). Para determinar o valor da recompensa, o juiz deverá considerar “o esforço desenvolvido pelo descobridor para encontrar o dono, ou o legítimo possuidor, as possibilidades que teria este de encontrar a coisa e a situação econômica de ambos.” (art. 1.234, parágrafo único, CC).
Ressalta-se que o “descobridor responde pelos prejuízos causados ao proprietário ou possuidor legítimo, quando tiver procedido com dolo.” (art.1234, CC).
5- CÓDIGO PENAL
Conforme ressalta Luiz Guilherme Marinoni, Sergio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero, nos casos em que a coisa achada seja entregue à autoridade policial e esta suspeite da existência de crime, poderá a autoridade desde logo instaurar inquérito policial a respeito. Compete ao juízo criminal o processamento do possível ilícito e a entrega da coisa, desde que inexista dúvida a respeito de sua propriedade ou da sua posse legítima. Caso exista dúvida, a controvérsia deverá ser declinada para a jurisdição civil.[7]
6- COMPARAÇÃO ENTRE O CPC/73 E O CPC/15
O CPC/2015 trouxe inovações para o processo de divulgação de coisa achada, a primeira delas foi a mudança topografica de localização no código, uma vez que o CPC/1973 dispunha sobre as coisas vagas no Livro IV - Dos procedimentos especiais, Título II, capítulo VII, arts.1.170 a 1.176, já o CPC/2015 passou a prever sobre o assunto no Livro I - Do processo de Conhecimento e do Cumprimento de Sentença, Título III, capítulo XV, seção VIII, Art. 746.
Outra novidade foi a dispensa da dupla publicação de editais para que o dono reclamasse a coisa (art. 1.171, caput, CPC/1973), bastando a publicação na internet, no site do tribunal e do Conselho Nacional de Justiça (art. 746, , §2, CPC/2015).[8]
Por fim, nota-se que o CPC/15 não repetiu as disposições dos artigos 1.172 a 1.176 do CPC/73, dentre elas a que dizia sobre a oitiva do Ministério Público e do representante da Fazenda Pública (art. 1.172, CPC/73).
7- CONCLUSÃO
O Novo CPC trouxe algumas alterações a respeito do Procedimento de Coisas Vagas, porém, como visto neste artigo “a espinha dorsal” deste procedimento foi mantida praticamente incólume. Desse modo, assim como no CPC passado, achada coisa alheia perdida, deve o sujeito entregar ao juízo competente ou a autoridade policial, que, por sua vez, remeterá ao juízo. Recebida a coisa pelo juiz, depois de depositada, será determinada a publicação de edital.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
[1] Graduando em direito pela Universidade Federal do Espírito Santo. E-mail: g.lemos.rocha@gmail.com
[2] Graduanda em direito pela Universidade Federal do Espírito Santo. E-mail: iorranemathias@hotmail.com
[3] GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Sinopses Jurídicas: Procedimentos Especiais. 10ª edição. São Paulo: Editora Saraiva, 2012. V. 13. Página 471.
[4] MEDINA, José Miguel Garcia. Novo Código de Processo Civil Comentado. 3ª edição. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015. Página 653.
[5] MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo Código de Processo Civil Comentado. 1ª edição. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015. Página 746.
[6] Ibidem. Página 747.
[7] MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo Código de Processo Civil Comentado. 1ª edição. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015. Página 747.
[8] FIGUEIREDO, Simone Diogo Carvalho . Novo Código de Processo Civil anotado e comparado para concursos. São Paulo : Saraiva, 2015. Página 875/876.
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